Adaptação e estudos: Ucranianas estudam economia no Paraná 08/03/2024 - 04:08

São 22 mil quilômetros que separam Olena Tsvirko e Tetiana Hohol da terra natal. Apesar da distância entre Brasil e Ucrânia, há um laço invisível que as une: o amor pela pátria e a pesquisa sobre economia. Em Toledo, oeste do Paraná, as pesquisadoras passam seus dias entre livros, eventos científicos e o foco em analisar o transporte ferroviário, para Olena; enquanto Tetiana estuda a situação socioeconômica de refugiados ucranianos.

É na Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) que tudo acontece. Para chegar até a sala da dupla, é preciso atravessar um corredor aberto, virar à direita e subir dois lances de escada, para então encontrar o bloco do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e Agronegócio (PGDra), onde ambas desenvolvem o trabalho.

“Tive muita sorte de chegar nesta Universidade, que se dedica à atividade agrícola, ao desenvolvimento rural, porque esse é o tema da minha pesquisa há muito tempo”, descreve Tetiana, que viu no Paraná uma oportunidade de continuar a pesquisa. Como Olena, ela chegou ao Brasil há pouco mais de  seis meses e já teve contato com a receptividade paranaense.

“Quando você vai para um continente completamente diferente e ouve sua língua nativa, é uma surpresa muito grande”, descreve Tetiana sobre como foi conhecer uma comunidade ucraniana em Cascavel, quando chegou ao Brasil com seu filho, Danylo. Com os colegas da Unioeste, não foi diferente. “Foi muito agradável porque estávamos preocupados em saber para onde ir, o que fazer, como iríamos chegar. Nós conhecemos os professores, e a primeira impressão foi de que todos são muito simpáticos”, descreve.

A jornada

A receptividade paranaense é unânime na fala dos pesquisadores bolsistas do Programa Paranaense de Acolhida aos Cientistas Ucranianos. Para Olena, não seria diferente, pois as pessoas que conheceu por aqui “são muito simpáticas e incríveis, sempre sorriem, estão prontos para ajudar”, nas palavras dela. Mas para viver este novo tempo, Olena e o marido Volodymyr atravessaram uma jornada. Em Varsóvia, longe do conflito, o casal voou para o Catar, depois para São Paulo, Cascavel, para enfim chegar em Toledo, um total de quase trinta horas de jornada.

 “Estamos nos adaptando, acho que vai dar tudo certo, mas sinto falta dos meus filhos e da minha mãe, que ficaram no oeste da Ucrânia”, conta Olena. As similaridades entre as duas pesquisadoras, que não se conheciam antes de chegar ao Paraná, continuam. Ambas estavam em Varsóvia, cidade polonesa antes de virem ao Brasil. Para Tetiana, a ida a outro país foi a oportunidade de escapar da Guerra que ocorre em Kiev. “Muitas pessoas estavam saindo porque havia informações de que em poucos dias estaria completamente ocupada [a cidade] e a maioria das pessoas tentava fugir”.

Quando Tetiana e o filho deixaram Kiev, permaneceram no oeste da Ucrânia por um tempo e até moraram em cidades fronteiriças do país. “Os russos não conseguiram invadir através das cidades, mas o que aconteceu nessas cidades foi um inferno para as pessoas”, conta. Por serem regiões muito próximas da capital ucraniana, os moradores também sofrem as consequências do conflito. “Infelizmente, eles [soldados russos] queimam e roubam as casas, então nós fomos para a Polônia, especificamente para trabalhar”.

Estar longe da sua terra causa um sentimento de impotência para Olena. “Todas as manhãs, quando acordo, leio as notícias, como foi a noite, o que aconteceu, e depois ligo para minha mãe, que ainda está em Kiev”. A preocupação, segundo ela, é constante, pois “nossos amigos e parentes estão todos na Ucrânia, e esperamos que todas essas guerras acabem logo e tudo fique bem”.

A pesquisa a partir de agora

O professor Lucir Alves é um dos pontos de ligação entre as duas pesquisadoras. Orientador dos projetos da dupla, ele destaca que as duas já estão em contato com professores da Pós, para integrarem projetos de pesquisa e planejar o desenvolvimento de publicações em conjunto. Olena e Tetiana já participaram de conferências, visitas técnicas a empresas da região e eventos sobre economia.

“Elas também estão envolvidas em projetos de extensão na Unioeste, onde todos os cinco ucranianos (dois em Toledo e três em Foz do Iguaçu) realizam visitas aos campi e em escolas do município”, explica o professor. É muito gratificante. Para além de poder acolher as pesquisadoras, para Lucir, a oportunidade de interação científica é excepcional. E não somente isso. “Também passamos a conhecer melhor outra cultura, culinária, fazer novos amigos, praticar língua estrangeira entre tantas outras coisas maravilhosas”, completa.

A pesquisa de Tetiana na Unioeste é uma continuação do que já trabalhava na Ucrânia. “Minha investigação baseou-se no fato de que, para apresentar quaisquer propostas para o desenvolvimento rural, é necessária uma abordagem sistemática, não apenas aspectos econômicos e demográficos”. No Paraná, ela pretende analisar mais a experiência do Brasil na organização desses territórios rurais. “É muito cedo para tirar conclusões precipitadas, mas o Brasil é um país agrícola, assim como a Ucrânia. Por isso, em primeiro lugar, eu espero fazer um bom networking e conexões entre cientistas”.

Um desejo antigo

Chegar a Toledo é a realização de um sonho para o marido de Olena, Volodymyr. “Quando eu recebi o convite do Brasil, primeiramente, falei para ele: ‘você vem comigo? O que você diz’. E ele disse ‘ok, vamos juntos, você trabalha e eu descanso às vezes’. Nós estamos sempre juntos”, sorri Olena.

Para além do trabalho na Universidade, chegar ao Paraná é a chance de contar uma nova história para o casal que está junto há mais de 30 anos. “No final de janeiro [de 2023] começamos a aprender português, e começamos a trabalhar com os documentos. Ainda não posso acreditar que estou neste país, interagindo com tantas pessoas maravilhosas”, descreve o marido.

O mesmo ocorre com Danylo, filho de Tetiana. Os acompanhantes das pesquisadoras em terras paranaenses se sentem bem recebidos até na culinária. “Quando fomos ao supermercado pela primeira vez, foi muito interessante para mim porque toda a comida que eu via na Ucrânia, aqui não é cara”. As frutas são destaque na experiência do rapaz de 16 anos. “Elas são muito doces e muito saborosas. Então isso é o primeiro de tudo que eu gostei, as frutas”.

Olena e Volodymyr destacam que cada pessoa que conhecem está disposta a ajudá-los. “Isso é muito gratificante. Há 45 anos eu estava na Argentina [em viagem de férias] e, graças à minha esposa, esse sonho de vir ao Brasil [por conta da viagem] se tornou realidade”. Toda a hospitalidade recebida durante os meses por aqui já está inserida na rotina do casal. Ao final da entrevista, aquele convite típico brasileiro veio da ucraniana Olena: “Vocês são bem-vindos em nosso apartamento para experimentar a nossa culinária”.

Texto e fotos: Jéssica Natal  - UEPG

 

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Adaptation and studies: Ukrainian women study economics in Paraná

 

Twenty two thousand kilometers separate Olena Tsvirko and Tetiana Hohol from their homeland. Despite the distance between Brazil and Ukraine, there is an invisible bond that unites them: the love for their country and research into economics. In Toledo, west of Paraná, researchers spend their days between books, scientific events and focusing on analyzing railway transport, for Olena; while Tetiana studies the socioeconomic situation of Ukrainian refugees.

It's at the State University of Western Paraná (Unioeste) that everything happens. To get to the duo's office, you have to cross an open corridor, turn right and climb two flights of stairs to find the block of the Postgraduate Program in Regional Development and Agribusiness (PGDra), where they both do their work.

"I was very lucky to arrive at this university, which is dedicated to agricultural activity and rural development, because this has been the subject of my research for a long time," says Tetiana, who considers Paraná an opportunity to continue her research. Like Olena, she arrived in Brazil just over six months ago and has already experienced how welcoming Paraná is.

"When you go to a completely different continent and hear it native language, it's a big surprise," says Tetiana about getting to know a Ukrainian community in Cascavel when she arrived in Brazil with her son, Danylo. It was no different with her colleagues from Unioeste. "It was really nice because we were worried about where to go, what to do, how we were going to arrive. We met the teachers, and the first impression was that everyone was very friendly," she describes.

The journey

The receptivity of the people of Paraná is unanimous for the scholarship researchers from the Paraná Program for Welcoming Ukrainian Scientists. For Olena, it was no different, as the people she met here "are very friendly and amazing, always smiling, ready to help", in her words. But in order to experience this new time, Olena and her husband Volodymyr went through a journey. From Warsaw, far from the conflict, the couple flew to Qatar, then to São Paulo, Cascavel, and finally to Toledo, a total journey of almost thirty hours.

"We're adapting, I think everything will be fine, but I miss my children and my mother, who stayed in the west of Ukraine," says Olena. The similarities between the two researchers, who didn't know each other before arriving in Paraná, continue. Both were in Warsaw, a Polish city, before coming to Brazil. For Tetiana, going to another country was an opportunity to escape the war taking place in Kiev. "Many people were leaving because there was information that in a few days it [the city] would be completely occupied and most people were trying to escape".

When Tetiana and her son left Kiev, they stayed in western Ukraine for a while and even lived in the country's border towns. "The Russians didn't manage to invade through the towns, but what happened in those towns was hell for people," she says. As these areas are very close to the Ukrainian capital, residents are also suffering the consequences of the conflict. "Unfortunately, they [Russian soldiers] burn and rob the houses, so we went to Poland specifically to work".

Being away from her homeland causes a feeling of helplessness for Olena. "Every morning when I wake up, I read the news, how the night went, what happened, and then I call my mother, who is still in Kiev." The worry, she says, is constant, because "our friends and relatives are all in Ukraine, and we hope that all these wars will end soon and everything will be fine".

Research from now on

Professor Lucir Alves is one of the links between the two researchers. He supervises the pair's projects and points out that the two are already in contact with professors from the Graduate School, in order to integrate research projects and plan the development of joint publications. Olena and Tetiana have already taken part in conferences, technical visits to companies in the region and economic events.

 "They are also involved in extension projects at Unioeste, where all five Ukrainians (two in Toledo and three in Foz do Iguaçu) visit campuses and schools in the municipality," explains the professor. It's very gratifying. As well as being able to host the researchers, for Lucir, the opportunity for scientific interaction is exceptional. And not only that. "We also got to know another culture, cuisine better, made new friends, practiced foreign languages and so many other wonderful things," he adds.

Tetiana's research at Unioeste is a continuation of what she was already working on in Ukraine. "My research was based on the fact that in order to present any proposals for rural development, a systematic approach is needed, not just economic and demographic aspects." In Paraná, she intends to further analyze Brazil's experience in organizing these rural territories. "It's too early to jump to conclusions, but Brazil is an agricultural country, just like Ukraine. That's why, first and foremost, I hope to make good networking and connections between scientists."

An old wish

Coming to Toledo is the realization of a dream for Olena's husband, Volodymyr. "When I received the invitation from Brazil, I first said to him: 'Are you coming with me? What do you say? And he said 'ok, we'll go together, you work and I'll rest sometimes'. We're always together," smiles Olena.

As well as working at the university, arriving in Paraná is a chance to tell a new story for the couple who have been together for over 30 years. "At the end of January [2023] we started learning Portuguese, and we started working on the documents. I still can't believe I'm in this country, interacting with so many wonderful people," describes the husband.

The same goes for Danylo, Tetiana's son. The researchers' companions in Paraná feel welcomed even in terms of cuisine. "When we went to the supermarket for the first time, it was very interesting for me because all the food I saw in Ukraine is not expensive here." Fruit is a highlight of the 16-year-old's experience. "They're very sweet and very tasty. So that's the first thing I liked, the fruit".

Olena and Volodymyr point out that everyone they meet is willing to help them. "That's very gratifying. 45 years ago I was in Argentina [on vacation] and, thanks to my wife, this dream of coming to Brazil [for the trip] came true." All the hospitality they received during their months here has now become part of the couple's routine. At the end of the interview, that typical Brazilian invitation came from Ukrainian Olena: "You're welcome to come to our apartment and try our cuisine".

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